Revista CEsA nº 1: Working Papers CEsA
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Revista CEsA nº 1 | CEsA 40 anos: CEsA disponibiliza em formato digital a coleção completa de Working Papers produzidos no decorrer dos 40 anos de existência do centro de investigação

 

Desde o n.º 1, de 1984, até à última edição, de 2023, todos os Working Papers do CEsA e mais 21 Brief Papers encontram-se disponíveis em formato digital para download gratuito no Repositório ULisboa 

 

Para comemorar os 40 anos da sua fundação, o Centro de Estudos sobre África e Desenvolvimento (CEsA/CSG/ISEG/ULisboa) disponibilizou a sua coleção completa de Working Papers e Brief Papers em formato digital para download gratuito no Repositório da Universidade de Lisboa (Repositório ULisboa). Também podem ser consultados em ordem cronológica no site do CEsA e no Catálogo Coletivo da Universidade de Lisboa, de acesso exclusivo aos estudantes. 

São mais de 200 documentos de trabalho que refletem a trajectória da produção científica de um dos centros de investigação mais antigos em Portugal na área dos estudos de desenvolvimento e África. Desde o n.º 1/1984 (“Uma experiência de integração económica em África”, de Eugénio Inocência e Manuel Ennes Ferreira), até à edição mais recente, n.º 190/2023 (“Study of the Value Chain of the Tourism Sector in Angola as an Alternative Economic, Social, and Environmental Development Strategy Under the Prodesi Programme”, de Eduardo Sarmento), há uma grande variedade temática à disposição dos leitores em língua portuguesa, com algumas edições em inglês e francês. 

“Todos os centros de investigação têm uma coleção desta natureza para divulgar o tipo de investigação que se está a fazer. Temos uma coleção muito flexível e diversificada, que evidencia a evolução do percurso de investigação que se vai fazendo”, explica João Estêvão, um dos investigadores-fundadores do CEsA, responsável pela linha de investigação 1 – Economia, Desenvolvimento e Cooperação Internacional, e professor reformado do ISEG. 

O investigador orgulha-se da manutenção, por parte do centro, de abordagens que agregam perspetivas integradoras e multidisciplinares do Desenvolvimento: “Sempre tivemos a preocupação de que os Working Papers tivessem uma grande amplitude e que pudessem congregar contribuição de várias áreas disciplinares sobre as questões do Desenvolvimento”. 

Professor reformado do ISEG e um dos investigadores-fundadores do CEsA, João Estêvão, durante o Seminário Internacional In Progress 4, em 29 de novembro de 2022. Crédito: CEsA/Reprodução.

Digitalização dos documentos 

A digitalização dos documentos de trabalho foi uma iniciativa da Biblioteca Francisco Pereira de Moura, do ISEG. O trabalho começou na pandemia, pelo funcionário Paulo Fonseca, motivado a expandir o arquivo digital da Biblioteca. “A minha preocupação era que toda a informação possível ficasse em acesso aberto e as pessoas pudessem aceder em qualquer local à documentação. A missão do acesso aberto visa promover o reconhecimento do trabalho dos investigadores, aumentando o impacto da investigação e a visibilidade, neste caso, do ISEG”, diz Fonseca.  

Funcionário da Biblioteca Francisco Pereira de Moura, do ISEG, Paulo Fonseca. Crédito: ISEG/Reprodução

Fonseca explica que o trabalho obedeceu a uma metodologia que consistiu numa primeira fase em digitalizar os documentos de trabalho que se encontravam em suporte papel e, posteriormente em incluir os ficheiros no Repositório da Universidade de Lisboa, com a catalogação de todas as principais informações bibliográficas (título, autor, data de publicação, citação, resumo, palavras-chave, etc.). “O nosso grande objetivo é tornar a nossa biblioteca digital, como uma fonte dinamizadora da investigação que se faz na escola”, complementa. 

Para o entrevistado, as principais vantagens de tornar os documentos digitais é a redução da dependência e do gasto de papel; a libertação dos espaços físicos da biblioteca, contribuindo para a minimização da quantidade de material impresso; mantendo a qualidade e conservação dos documentos, que em suporte papel se vão deteriorando ao longo do tempo. Além da comodidade e acessibilidade do leitor. “Também acho muito interessante que o repositório permita que o utilizador tenha acesso aos dados estatísticos, tais como os números de downloads efetuados ao longo do ano e de visitantes que tiveram acesso ao repositório”, conclui. 

 

Testemunho do Prof. Doutor João Estêvão sobre o historial da fundação do CEsA 

Transcrição: 

“Como estava a dizer há bocadinho, eu tive o privilégio de viver um momento importante nesta escola em Portugal, que foi a transição para a democracia, a revolução, a construção da democracia e, digamos, de uma nova Universidade em Portugal. 

Nova Universidade porquê? Porque as Ciências Sociais e Humanas estavam fortemente constrangidas. Existia Economia, mas a economia é um percurso diferente que vem de trás. Mas, por exemplo, não existia uma licenciatura em Sociologia. Era impensável nessa altura fazer uma coisa dessas. Houve uma experiência curiosa de criação e tiveram que dar-lhe outro nome, Instituto Superior de Ciências do Trabalho. Criou-se uma licenciatura em ciências do trabalho, que depois mudou logo a designação para Sociologia. Nessa altura, com a nova perspetiva para a Universidade no começo dos anos 80, colocou-se a questão ‘bem, nós temos de construir verdadeiramente uma Universidade’. Então, a opção foi apostar na formação avançada dos docentes, porque os docentes, os meus professores, por exemplo, a maior parte não estava na Universidade, vinha para a universidade, dava umas aulas, etc. E foi nessa altura que se resolveu pensar, então, neste campo de economia em particular mas não só, da construção de uma verdadeira universidade. 

A década de 80 foi uma década muito importante, porque foi o período em que, nesta escola, assistimos uma produção incrível de teses de doutoramento. As pessoas saíam para fora, França, Inglaterra, etc. E foi um período que marcou o modo como a escola se foi construir depois – só para dar uma ideia ao parêntese, em 1980, a escola tinha seis, sete doutorados, em 1990, tinha quase 10 vezes mais e a partir de certa altura, em Portugal, os docentes não doutorados desapareceram, sendo que isto já não se tem sentido. Bem, mas nessa altura foi assim. Depois, houve um conjunto de pessoas, nessa altura, que se orientaram para as questões do desenvolvimento. E nessa altura o apoio, sobretudo porque estávamos quase todos a pensar nas teses de doutoramento, não havia formação acima da licenciatura, é preciso ver isso, tínhamos licenciaturas de cinco anos e depois não havia mais nada. 

Nessa altura, considerou-se importante a construção de uns centros de investigação que permitissem trazer pessoas de fora, criar um ambiente de debate e um espaço apropriado para desenvolver a investigação científica. O primeiro centro criado, o CISEP, Centro de Investigação sobre a Economia Portuguesa, articulou-se três áreas diferentes. Uma dessas áreas era a área do desenvolvimento. Tivemos a possibilidade, na altura, de contar com a Professora Manuela Silva, que era uma referência já importante nessa área e a área de desenvolvimento começou a desenvolver trabalhos. Naturalmente que a perspetiva, digamos, de aplicação, era a realidade portuguesa. Entretanto, como havia muitas pessoas a discutir, a estudar e investigar sobre o problema do desenvolvimento numa perspetiva mais Internacional, começou-se a pensar que seria talvez oportuno criar um outro centro, porque no CISEP não era possível, onde se pudesse concentrar as pessoas da área do desenvolvimento, então isso aconteceu. Como vieram umas pessoas do CISEP, eu e o Professor Almeida Serra, em particular os dois, depois outros docentes já com experiência na área africanista como o Professor Lino Torres e o Professor Jochen Oppenheimer, e depois havia outras pessoas que tinham começado a estudar temas africanos e havia na altura uma série de estudantes oriundos dos países africanos de língua portuguesa que queriam, achavam interessante participar nisso. E isso acabou por orientar o centro numa perspetiva de estudos africanos, não quer dizer que todas as pessoas estivessem orientadas para os estudos africanos, mas numa perspetiva de estudos africanos. Eu próprio não trabalho propriamente em investigação Africana, eu trabalho na área do desenvolvimento, mais no campo do pensamento. E então resolveu-se criar – até porque já havia outras experiências no ISCTE e que nós andávamos, circulávamos o mercado, havia outras experiências – e então, foi nessa altura que decidimos criar um centro que considerou-se oportuno, devia ter o nome de África na designação, portanto, um centro especializado orientado para as questões do desenvolvimento. Esta, digamos, é uma primeira etapa até se construir o Centro. Com a constituição do Centro, alguns anos depois, resolvemos lançar um mestrado. Antes de ser mestrado foi um curso de pós-graduação, Desenvolvimento e Cooperação Internacional. Funcionou dois anos e isso foi quase 10 anos depois, levou algum tempo. Então formou-se o mestrado. 

Na fase inicial, nós tínhamos algumas preocupações. Havia uma que era dominante, porque quase todos nós, exceto os mais velhos – caso do Professor Oppenheimer e o Professor Lino Torres, que já tinham os doutoramentos – quase todos nós estávamos na altura estávamos orientados para esse objetivo que era a feitura das nossas teses de doutoramento. O centro funcionava como um espaço de discussão. Trazíamos pessoas daqui de Portugal, mas trazíamos várias pessoas de fora. A escola teve sempre algumas relações, sobretudo com França. Na altura, havia uma relação muito intensa com França, depois com outros espaços, de maneira que aqui circularam muitas pessoas. Isto era uma dimensão que nós tínhamos que era o debate de ideias, o conhecimento dos programas de investigação que outras pessoas faziam no país e fora. Nessa altura começamos a pensar “bem, mas nós podemos aproveitar esse debate de ideias para organizar alguns tipos de publicação”. Uma ideia que surgiu, foi a de uma coleção de working papers, os documentos de trabalho, que permitia que nós puséssemos à disposição trabalhos que iam sendo desenvolvidos, mas que não eram trabalhos acabados. Depois houve outras ideias, fizemos alguns outros lançamentos, mas que morreram relativamente cedo. A dos documentos de trabalho conseguiu-se manter sempre, desde sempre nós fizemos isso. Fizemos isso com a ideia da abertura a outras pessoas que viessem cá, que fizessem, por exemplo, um seminário, e que isso pudesse dar lugar a uma publicação a materializar em papel, para ficar a divulgação dessas ideias. É natural que, na altura, a única preocupação que nós tínhamos, podemos dizer assim, era que a publicação desse a conhecer trabalhos no nosso campo, que era o campo dos estudos de desenvolvimento. E em termos relativamente latos, digamos assim. 

Eu paro um bocadinho para fazer aqui também um comentário que é importante para se entender isso. É assim, nós estávamos numa escola de economia. As pessoas que constituíram o Centro, com exceção do Professor Armando Castro, já falecido, que era de relações internacionais, todas as pessoas eram de economia. Mas a nossa preocupação era não fazer uma abordagem do desenvolvimento centrada exclusivamente na perspetiva económica. E isso coincidiu com um momento relativamente interessante que é o surgimento (a primeira escola na área de estudos de Desenvolvimento surge ainda nos anos 60 e é a de Sussex) da escola de Sussex. Mas o que é curioso é que, nessa altura, algumas escolas estavam a lançar formação e centros nesta área. Na London School of Economics apareceu o DESTIN, Development Studies Institute, que hoje é o Departamento de Desenvolvimento Internacional; na Holanda, aparecia na universidade de Haia (onde hoje está localizado), que era o Instituto de Ciências Sociais. E, digamos que foi um período de emergência, de desenvolvimento de uma abordagem do desenvolvimento numa perspetiva mais multidisciplinar que nós tínhamos sempre a preocupação de não ser entendidos como economistas que queriam discutir a questão do desenvolvimento de uma perspetiva económica. Bem, isso voltando à questão para, no fundo, explicar porque é que nós tivemos a preocupação que esses working papers tivessem uma grande amplitude e que pudessem congregar, digamos, a contribuição de várias áreas disciplinares. É exatamente a mesma preocupação que existe quando nós propusemos à escola criar uma formação avançada pós-graduada em Desenvolvimento e Cooperação Internacional, um grande debate à volta do que é que poderia ser. Pareceu-nos que era importante estar a palavra desenvolvimento que tinha a ver com uma determinada área de estudos, mas a dimensão Internacional também deveria estar, e a dada altura pensei que a melhor forma era introduzir através do termo cooperação internacional, porque até era uma área muito procurada em Portugal por toda a gente porque Portugal, com a independência das colónias africanas – portanto, século XX, colónias africanas – houve uma grande orientação para as questões da cooperação. De maneira que nós decidimos, então, ‘vamos chamar a isso Desenvolvimento e Cooperação Internacional’, e a designação ainda se mantém. 

E desde o início a preocupação era fazer um produto que não fosse um produto apenas da Economistas, mas isso gerou sempre grandes polémicas. Hoje as questões são um bocado diferentes, porque os economistas quase desapareceram do próprio mestrado. Aliás, enfim, foi uma área que entrou em relativo declínio, até porque as novas gerações que estudam as questões de desenvolvimento estudam numa perspetiva mais da ortodoxia económica, têm outros objetivos. Nós queríamos entender o desenvolvimento numa perspetiva mais aberta, mais integradora de outras dimensões. O Mestrado veio completar isso e com a ideia de que – naturalmente, o mestrado, primeiro uma pós-graduação de dois anos, depois o mestrado – de que os produtos que iriam aparecer, sobretudo os trabalhos finais, pudessem também dar a possibilidade de inserir cada vez mais publicações de investigadores ligados ao centro sobre as questões do desenvolvimento.
 

Esta é um pouco a história de como as coisas apareceram e se desenvolveram, enfim. Depois teve um percurso, mas podemos, se quiser fazer mais algumas questões à volta disso, mas julgo que para fazer o historial de como aparece o centro, os documentos de trabalho, por quê, qual o objetivo, qual a preocupação, a articulação disso com o mestrado, houve sempre essa articulação, portanto, são essas as questões de fundo.” 

 

 

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Texto publicado na edição nº 1 da Revista CEsA. Autoria: Marianna Rios/Comunicação CEsA. Edição: Sónia Frias/Direção do CEsA e Filipe Batista/CEsA Comunicação. Tradução: Inês Hugon. Design: Felipe Vaz.


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